Deputados e entidade de direito previdenciário afirmam que novas regras podem impedir trabalhadores rurais de se aposentar, mas governo ressalta que a proposta de reforma da Previdência (PEC 6/19) é baseada em dados e não mentiras. O assunto foi debatido nesta quarta-feira (22) em audiência pública da comissão especial que analisa a matéria.
Para a presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Jane Lúcia Berwanger, o pagamento de R$ 600 fixos por ano, por núcleo familiar, previsto na reforma, ignora a instabilidade da produção no campo, por questões climáticas ou pragas. “Se colocasse para o trabalhador escolher se prefere pagar 3% ou 4% do faturamento anual, em vez de pagar uma contribuição fixa, certamente ele iria preferir a primeira opção, porque ele não sabe quanto vai ganhar com a venda da produção”, disse.
Berwanger disse que as regras podem fazer com que os trabalhadores rurais sejam jogados na miserabilidade e precisem recorrer ao Benefício de Prestação Continuada (BPC). “Temos de decidir se vamos valorizar o trabalho rural ou se vamos dar esmola para essas pessoas.”
A especialista alertou ainda para o risco de generalização sobre fraudes no setor. Ela explica que os 97 mil indícios de fraude em aposentadorias rurais apontados por auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) representam 1% do total de 9,5 milhões de benefícios concedidos. Para o deputado Vinícius Poit (Novo-SP), porém, o sistema atual acaba produzindo injustiças e favorece fraudes. “Os bons pagam pelos ruins e isso é muito duro e injusto”.
Contra as mudanças
Deputados de vários partidos se posicionaram contra as mudanças. O deputado Heitor Schuch (PSB-RS) afirmou que a contribuição obrigatória é um problema para boa parte dos agricultores rurais. “No ano que não chove e que não tem safra, como é o caso do Nordeste? Como fazer”, indagou. Ele fez um apelo para que os trabalhadores rurais ficassem de fora da reforma. O deputado Beto Pereira (PSDB-MS) afirmou que o partido já se posicionou a favor de retirar a aposentadoria rural e o Benefício da Prestação Continuada (BPC) da proposta.
As análises do Executivo estão descoladas da realidade, na opinião do deputado Bira do Pindaré (PSB-MA). “Uma coisa é olhar os números na frieza do ar condicionado e outra é a realidade que a gente vive. Conversem com as pessoas e acabem com o discurso de fraude, porque fraude há em todo lugar. Se fraude for critério, vamos fechar as portas de tudo.”
O deputado José Guimarães (PT-CE) afirmou que as mudanças da PEC aumentarão a pobreza rural. “O direito à aposentadoria é clausula pétrea.” Em março, treze partidos se posicionaram contra a inclusão da aposentadoria rural na reforma.
Dados do governo
Representante do governo na audiência, o secretário especial adjunto de Previdência e Trabalho no Ministério da Economia, Bruno Bianco, afirmou que as mudanças propostas na reforma da Previdência (PEC 6/19) são baseadas em dados e não mentiras.
Segundo Bianco, “muita mentira é dita em relação ao trabalhador rural”. Ele cita, por exemplo, a diferença na expectativa de sobrevida. “No urbano e no rural é muito próxima”, disse. Bianco também destacou que 3 em cada 4 trabalhadores que começam a trabalhar antes dos 14 anos moram nas cidades e não no campo. E que a maioria (60%) dos que vivem em extrema pobreza também estão em ambiente urbano. “Peço perdão pela palavra, mas é mentira e temos de desdizer todas as falsidades que se dizem em relação ao rural. É nossa função enquanto governo desdizer essas falácias.”
O secretário afirmou que a mudança sugerida na reforma vai fazer com que o trabalhador rural tenha acesso a outros benefícios previdenciários, como auxílio-doença e salário-maternidade. “Hoje o rural é excluído do sistema. Ele só nasce para o INSS quando se aposenta.”
A reforma estabelece idade mínima de 60 anos para trabalhadores e trabalhadoras rurais. Hoje, as mulheres do campo se aposentam aos 55 anos. A proposta também amplia de 15 para 20 anos o tempo de contribuição para os dois sexos. As mudanças serão feitas gradativamente, segundo a PEC, até atingir os valores pretendidos em 2030.
Além disso, os segurados especiais (trabalhadores rurais e pescadores artesanais) vão precisar pagar pelo menos R$ 600 por ano referente ao faturamento da produção. “O rural já contribui para o sindicato com R$ 20 por mês por pessoa, na média. Portanto, eles já pagam para o sindicato mais do que pagarão para a Previdência”, ponderou Bianco. Segundo ele, o governo chegou ao valor da contribuição de R$ 600, por núcleo familiar, a partir do cálculo do faturamento médio de agricultores familiares nos últimos anos.
O governo pretende economizar R$ 92 bilhões em 10 anos com as mudanças de aposentadoria para os segurados especiais, ou 7,5% dos R$ 1,2 trilhão desejados pelo Executivo.
Fonte: Agência Câmara Notícias