Data: 04/06/2019
A MP 871/2019, que segue agora para a sanção da Presidência da República, cria um programa de revisão de benefícios previdenciários, exige cadastro do trabalhador rural e restringe o pagamento de auxílio-reclusão apenas aos casos de pena em regime fechado. Votada na Câmara dos Deputados na última quinta-feira (30), a MP perderia a eficácia já nesta terça-feira (4). Para viabilizar a aprovação da matéria no último dia de sua validade, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, convocou uma sessão deliberativa para esta segunda.
— Os senadores se mobilizaram para votar hoje esta MP a partir de um acordo construído com os líderes. Quero agradecer a todos os senadores que vieram, representando o povo brasileiro, sabendo da responsabilidade que é votar esta MP que tanto interessa ao país — afirmou o presidente.
Debate
A aprovação da MP, no entanto, não ocorreu sem polêmica. Tanto o conteúdo da matéria como o pouco prazo para a análise foram motivo de debate em Plenário. Segundo o senador Major Olimpio (PSL-SP), a votação da matéria é pelo bem do país. Ele disse que a MP pode permitir uma economia de quase R$ 10 bilhões anuais para os cofres do governo e argumentou que é necessário combater as fraudes previdenciárias, com o objetivo de auxiliar quem realmente precisa.
— A MP vai combater o crime e não retira direito de quem tem benefício do INSS. A economia é significativa — argumentou o senador.
O senador Alvaro Dias (Pode-PR) manifestou apoio à MP, mas lamentou o fato de a matéria chegar ao Senado “no último momento”. Ele também pediu uma reflexão sobre as desonerações e os grandes devedores, que estariam colaborando com o deficit público. O senador Reguffe (sem partido-DF) anunciou voto favorável à MP que, em sua visão, é importante por combater fraudes e garantir mais economia aos cofres públicos. Segundo o senador Eduardo Braga (MDB-AM), a MP é uma forma de reduzir os deficits público e da Previdência.
— Combater a fraude é algo muito importante para o país — afirmou o senador.
A senadora Juíza Selma (PSL-MT) disse que a MP torna o INSS mais eficiente. Já o senador Plínio Valério (PSDB-AM) afirmou apoiar todo ato que ajude a combater corrupção. Ele disse que vai pedir ao governo um plano de cobrança de grandes devedores previdenciários. O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) também discursou em apoio à MP, pois “os prejuízos com as fraudes são muito grandes”. Segundo a senadora Simone Tebet (MDB-MS), a MP é muito clara, importante e combate crimes.
O senador Jorge Kajuru (PSB-GO) admitiu que a MP tem “mérito relevante”, ao tentar recuperar os desvios das fraudes e “fechar as portas para novas fraudes”. Mas a matéria, apontou o senador, tem inúmeros defeitos — como a falta de medidas de combate aos grandes devedores, por exemplo.
Desafio
De acordo com senador Humberto Costa (PT-PE), a bancada do PT não foi convidada para nenhum acordo. Ele disse que a MP, na verdade, é uma minirreforma da Previdência. Segundo o senador, as medidas de eficiência propostas pelo governo poderiam ser implementadas de forma administrativa. Humberto Costa afirmou que “o grosso das fraudes” não está no BPC ou nas aposentadorias rurais, mas está nos grandes empresários. Na visão do senador, as medidas da MP são “absolutamente perversas”. Ele também criticou a exclusão dos sindicatos como legitimados para atestar o trabalho rural e desafiou o governo a mostrar, daqui a um ano, a economia prometida.
— Na verdade, esta proposta quer fazer revisão para poder cortar dos pobres, podendo gerar injustiça. Inclusive, traz o bônus para os médicos que fizerem mais perícias, e quem conhece sabe que a perícia é sempre para negar os direitos do trabalhador. Esse governo não gosta de pobre, quem gosta de pobre é o PT. E nós aceitamos essa afirmação do presidente da República — declarou o senador, lembrando uma fala do presidente Jair Bolsonaro veiculada pela internet na última quinta-feira (30).
Sindicatos
Na visão do senador Carlos Viana (PSD-MG), a MP é “excepcional” no combate à fraude e na responsabilidade com as contas públicas, mas existem pontos que exigiriam mais tempo para a análise. O senador criticou, por exemplo, a previsão da retirada da legitimação de sindicatos e federações para emitir documentos de comprovação de trabalho rural. Segundo Carlos Viana, essa medida vai prejudicar os produtores rurais mais pobres. Nelsinho Trad (PSD-MS) anunciou voto favorável, mas manifestou apoio às discordâncias do colega de partido.
Em resposta às críticas, o líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), argumentou que foram feitas mudanças na MP para atender aos trabalhadores do campo. Ele disse que a MP oferece instrumentos para evitar fraudes e atender melhor o cidadão que realmente precisa. O senador Izalci Lucas (PSDB-DF), que presidiu a comissão mista que analisou a matéria, disse que o próprio trabalhador rural poderá fazer a “auto-declaração”, tornando o processo mais simples. Ele registrou que foi construído um grande acordo sobre o texto final e lembrou que foram apresentadas 570 emendas, das quais 120 foram acatadas.
— Essa MP traz modernidade, eficiência e economia ao INSS — declarou Izalci.
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) disse que para combater fraudes não seria necessária uma MP, mas apenas uma portaria. Na verdade, segundo a senadora, a MP é uma “minirreforma da Previdência”, por dificultar o recebimento de BPC e outros benefícios. Rogério Carvalho (PT-SE) apontou que já existem instrumentos para o combate às fraudes. Para o senador, a MP criminaliza a parcela mais pobre da população. O senador Jaques Wagner (PT-BA) também lamentou a exclusão dos sindicatos, “pois a democracia se faz com representação popular, social e sindical”.
Segundo o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), as fraudes podem ser combatidas por meio de atos administrativos. Ele disse que, na realidade, a MP antecipa temas que serão tratados na PEC da Reforma da Previdência (PEC 6/2019), penalizando os mais pobres.
— Sou favorável ao combate a qualquer tipo de fraude. Mas isso não pode ser usado para prejudicar os mais pobres ou criminalizar os movimentos sindicais – afirmou Randolfe.
Destaques
O senador Otto Alencar (PSD-BA) chamou de “matéria estranha” um item do texto final da MP que, segundo ele, poderia abrir espaço para quebra de sigilo bancário de beneficiários de BPC e aposentadoria rural (art.124 B). Ele chegou a apresentar um destaque para excluir essa parte do texto, mas o líder do governo, senador Fernando Bezerra, afirmou que o governo vai vetar esse item. Assim, o destaque foi retirado.
O senador Angelo Coronel (PSD-BA) também apresentou um destaque para retirar a parte do texto que excluiu a participação dos sindicatos no sistema de segurados especiais. Na opinião do senador, retirar essa função dos sindicatos significa prejuízo para os trabalhadores rurais mais pobres, que certamente terão mais dificuldades em chegar até os postos autorizados. Os sindicatos, acrescentou Coronel, também ajudam a esclarecer as rotinas e as exigências para buscar os benefícios. Depois do apelo do líder do governo, Coronel retirou seu destaque.
Ainda foi apresentado um requerimento, pelo senador Eduardo Braga, pedindo um ajuste redacional apenas para trocar a palavra “gênero” pela palavra “sexo”, por permitir melhor clareza. O senador Marcos Rogério (DEM-RO), que atuou como revisor da MP na comissão, acatou a sugestão. As senadoras Rose de Freitas (Pode-ES), Mara Gabrilli (PSDB-SP) e Simone Tebet lamentaram a troca dos termos, considerada desnecessária. Simone ainda alertou para o risco de a MP ser questionada na Justiça, se a troca das expressões for considerada alteração no mérito.
Prazo
Apesar da aprovação, o pouco prazo para a análise da MP no Senado foi muito criticado por vários senadores. A matéria chegou ao Senado no último dia de validade. Com prazo reduzido, disse o senador Jorge Kajuru, o Senado não tem tempo de melhorar o texto da MP. Na mesma linha, o senador Carlos Viana criticou a falta de tempo para discutir “medidas que afetam a vida de tantos brasileiros”.
O senador Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB) reconheceu avanços, criticou pontos da MP e disse que é constrangedor não ter tempo para sugerir modificações no texto. Por sua vez, o senador Otto Alencar afirmou que a MP chegou “muito em cima do prazo e isso precisa ser corrigido”. Para Reguffe, a Câmara tem que não apenas permitir mais tempo ao Senado para as MPs, mas tem que votar os projetos enviados pelo Senado que estão parados naquela Casa.
— Quando a Câmara não vota os projetos do Senado, não é desrespeito ao autor do projeto, mas é um desrespeito ao eleitor — afirmou Reguffe.
O presidente Davi Alcolumbre informou que consta da pauta da Câmara dos Deputados a PEC 70/2011, que garante mais tempo para o Senado analisar medidas provisórias. A proposta (PEC 11/2011 no Senado) fixa a vigência de MPs em 120 dias, sem possibilidade de prorrogação. De acordo com o texto que saiu do Senado, a Câmara tem 80 dias para votar as matérias, com o trancamento da pauta após 70 dias. Em seguida, o Senado tem 30 dias de prazo, com sobrestamento após 20 dias. Depois disso, os deputados têm mais 10 dias para analisar as emendas apresentadas pelos senadores.
Fonte: Agência Senado